Notícias

Saúde com Arte: Caminhos da Agroecologia (RJ)

Exposição fotográfica do Instituto Nacional de Câncer (INCA) mostra experiências agroecológicas em comunidades rurais

Publicado: 13/11/2020 | 10h13
Última modificação: 13/11/2020 | 10h40

Na série “Saúde com Arte”, o Centro Cultural do Ministério da Saúde (CCMS) divulga iniciativas espalhadas pelo Brasil que unam cultura, arte e saúde. No sexto texto da série, conversamos com a epidemiologista Fernanda Nogueira e a comunicadora social Marise Mentzingen, do Instituto Nacional de Câncer (INCA), no Rio de Janeiro (RJ). Elas conversaram sobre o projeto “Caminhos da Agroecologia: cultivando a vida”, que criou uma exposição fotográfica que mostra experiências agroecológicas em comunidades rurais e informa a população sobre a relação entre câncer e agrotóxicos.

Se você faz parte ou conhece algum grupo que dissemina cultura, saúde e arte pelo Brasil, envie um e-mail para nós: ccms@saude.gov.br 

Numa das imagens, trabalhadores carregam caixas de batatas-doce em um caminhão. Em outra, um casal sorri para a câmera ao mostrar os produtos na barraquinha da feira. Numa terceira, um homem carrega uma enxada nas costas e olha na direção das montanhas. As fotos que compõem o projeto “Caminhos da Agroecologia: cultivando a vida” são importantes não só por seu aspecto artístico. São, sim, belíssimas imagens, mas sua principal função é chamar a atenção do público por meio de  exposições fotográficas  sobre um problema central no Brasil: a importância de uma agricultura com base ecológica e o seu impacto no meio ambiente e na saúde.

Desde 2012, o Instituto Nacional de Câncer (INCA), no Rio de Janeiro (RJ), trabalha em fóruns de discussão e parcerias com o objetivo de fomentar o debate e a conscientização sobre a relação entre os agrotóxicos e o câncer, os efeitos na saúde da população e dos trabalhadores rurais e os impactos negativos no meio ambiente. Esse movimento se intensificou a partir de 2015, com a publicação do posicionamento oficial do Inca sobre agrotóxicos e câncer. Nesse documento, o Instituto afirma seu compromisso em alertar à população sobre danos dos agrotóxicos à saúde humana e indica a agroecologia como estratégia de prevenção do câncer, promoção da saúde e alternativa ao modelo dominante do agronegócio. 

- Neste contexto, a composição de uma exposição fotográfica poderia contribuir para conferir visibilidade às iniciativas agroecológicas, para além de uma perspectiva de resistência, destacando a relevância deste modelo para a produção de alimentos saudáveis, seguros e livres de agrotóxicos, que promove proteção e promoção da saúde do trabalhador e da trabalhadora do campo e da cidade - explica a epidemiologista Fernanda Nogueira, uma das coordenadoras do projeto.

Para isso, a equipe do Inca visitou seis municípios do Rio de Janeiro e um em São Paulo: Casimiro de Abreu, Guapiaçu, Teresópolis, São João da Barra, Campos dos Goytacazes, Paraty e Ubatuba. O objetivo foi colher, a partir de registros fotográficos, a essência de algumas iniciativas agroecológicas nesses municípios. Mostrar as contradições da coexistência entre duas formas de produção agrícola nos territórios: baseada nos princípios do agronegócio e na agroecologia, e apontar as potencialidades deste último, um modelo de base mais sustentável. O contato direto com a população foi muito rico, mas trouxe seus desafios:

- O medo foi uma emoção muito manifestada. Houve pessoas que concordaram em ser fotografadas, porém se arrependeram, com medo de represálias e, assim, todo o trabalho de registro fotográfico, às vezes de um dia inteiro, era perdido. Mas também sentimos que vários ficaram felizes e se sentiram prestigiados com a visita de representantes do Ministério da Saúde e orgulhosos em mostrar o trabalho deles. No geral, eram pessoas sofridas e desconfiadas, por isso era necessária a intermediação de lideranças locais nos quais eles confiavam, para que abrissem as suas casas e seus cultivos - conta Marise Mentzingen, representante da Comunicação Social do Inca, que também participou diretamente das visitas locais e da concepção da exposição.

A exposição foi lançada em junho de 2017, no hall do Inca, num evento em celebração ao Dia Mundial do Meio Ambiente. Nos anos seguintes, a exposição ainda ocorreu em outros pontos do estado do Rio, além do prédio do Ministério da Saúde em Brasília e do IV Encontro Nacional de Agroecologia, em Belo Horizonte. As comunidades que participaram do projeto também receberam a exposição fotográfica no formato de banners, para que tivessem a autonomia de montá-la.

A importância da comunicação local

Além de ter produzido um rico acervo fotográfico e tratar de um tema muito relevante para os nossos tempos, o projeto Caminhos da Agroecologia serve ainda para lembrar a importância da comunicação local. Para Nogueira, o projeto é uma forma de aprofundar as conexões entre desenvolvimento sustentável, agroecologia, saúde e câncer, contribuindo para a formação de uma consciência ambiental, sanitária, social e política.

-  Temas como câncer relacionado ao trabalho e ao ambiente, agrotóxicos e câncer, saúde ambiental e saúde humana, entre outros, poderiam ser melhor explorados nesse tipo de estratégia de comunicação. Penso que uma grande contribuição de estratégias que utilizam a imagem como testemunho, com a população local, é promover o debate acerca da realidade que está sendo apresentada e possibilitar a formação de um pensamento crítico sobre essa dada realidade - explica.

Mentzingen também fala sobre como foi importante a construção da experiência de forma direta com os moradores das localidades trabalhadas, para que se pudesse refletir o clima, apreensões e expectativas vividas por populações que pouco são ouvidas pela grande mídia. Porém, ela destaca que além da dimensão do trabalho local e da exposição física, vem sendo fundamental a expansão para um formato digital.

- A exposição foi planejada para ter um formato híbrido, desde o início. Fizemos o lançamento dela no INCA  e montamos versões dela fisicamente nas localidades onde foram feitas as fotos para a exposição, de modo a agradecer as contribuições e aumentar a autoestima de sua população. Mas também disponibilizamos a versão on-line no site do INCA, exatamente para termos um alcance maior e poder levar um pouco do que presenciamos para além das dimensões de tempo e espaço - destaca Marise.

O projeto é uma parceria entre o Inca, organizações não governamentais e movimentos sociais como a Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida, a Associação Agroecológica de Teresópolis, o Movimento dos Atingidos por Barragem, o Fórum das Comunidades Tradicionais de Angra dos Reis, Paraty e Ubatuba, a Associação dos Geógrafos Brasileiros, o GT Saúde do Trabalhador da Secretaria Municipal de Casimiro de Abreu,o  Centro Tiê de Agroecologia. De acordo com Nogueira, “sem os parceiros externos, o projeto não teria condições de ser viabilizado.”

Entre os próximos passos  para o “Caminhos da Agroecologia” está a publicação de um livro, em formato digital, com narrativas e histórias sobre cada um dos territórios visitados pela equipe. O livro já está  em processo de edição.

Confira a exposição completa neste link

Fotos: Instituto Nacional de Câncer (Inca)
 

Qual conselho você daria para alguém que deseja iniciar um projeto de arte, cultura e saúde pelo Brasil? 

Fernanda Nogueira: Que não desistam desses projetos. Precisamos cada vez mais promover a saúde através de projetos artísticos e culturais.

Marise Mentzingen: Manter a mente aberta para apreender diferentes percepções de populações em pequenas localidades, não só por ser um país com dimensões continentais, com grande diversidade e riqueza de culturas, mas também para nos lembrarmos que a nossa missão, como profissionais de comunicação social e servidores do Ministério da Saúde, é tentar minimizar as desigualdades de informação, principalmente as dos menos favorecidos social e financeiramente e que dependem exclusivamente do SUS.