Notícias

Recortes da Inovação: Design Centrado no Ser Humano

No quarto artigo da série, entenda como funciona a técnica que coloca a experiência do usuário como foco para o processo criativo

Publicado: 15/01/2021 | 10h43
Última modificação: 15/01/2021 | 11h34

'Recortes da Inovação" é uma iniciativa do Centro Cultural do Ministério da Saúde (CCMS) para estimular o compartilhamento de informações e experiências sobre inovação, criatividade e cultura. No quarto artigo da série, Edno e Bianca explicam o que é “design centrado no ser humano” e como ele pode impulsionar o pensamento criativo. 

Não reagimos às qualidades físicas das coisas, mas ao que elas significam para nós”. 
(Krippendorff) 

O próprio nome já nos dá uma pista: “design centrado no ser humano” é uma técnica que abrange o pensamento criativo direcionado à interação do usuário com o objeto. Mas o método não se restringe a isso. Há diversos saberes associados à perspectiva do ser humano como núcleo do processo criativo que também merecem ser considerados. 

A técnica se debruça principalmente na análise comportamental do indivíduo. A intenção é conduzir olhares mais atentos às reações do indivíduo e entender os motivos (gatilhos) que as despertaram, enquanto ele se relaciona com o objeto ou o protótipo produzido. Ampliando esse conceito, ela também é aplicada na ideação de espaços, serviços e atendimentos - em suma, observa-se a experiência do usuário. 

Lembramos de uma história real que pode ajudar a compreensão desse conceito, que aconteceu num hospital pediátrico nos Estados Unidos, mais precisamente na sala de ressonância magnética. Ali funcionava um dos equipamentos projetados por Doug Dietz, designer de produto na General Eletric. Certa vez ele percebeu algo que o incomodou demais: uma jovem garotinha estava chorando, aterrorizada, porque precisaria entrar naquele "aparelho estranho" para fazer um exame. Vendo isso, ele partiu para uma pesquisa e chegou à conclusão que 80% dos pacientes pediátricos hospitalizados tinham que ser sedados para poderem lidar com aquela experiência. Isso tudo o deixou inquieto. Ele não ficaria em paz sabendo que o equipamento que ele ajudou a criar para salvar vidas também causava pânico nas crianças. 

Foi quando teve uma guinada! Utilizando a abordagem do Design Thinking ele repensou toda a experiencia de ser escaneado e a transformou numa aventura para as crianças. O que antes era uma máquina de ressonância magnética passou a ser uma grande história de aventura para as crianças, colocando o paciente como elemento central dela. Ele não alterou apenas a estética das máquinas e sala de exame, elaborou também um roteiro para os técnicos de laboratório conduzirem os pacientes na aventura (confira aqui o antes e depois). Agora, quando a criança chega, ela passa por uma experiência, não apenas por um exame. Os resultados foram excelentes, mas o que o deixou extremamente satisfeito foi a fala de uma menininha quando saiu da máquina e disse para sua mãe: “Mamãe, podemos voltar amanhã?” 

Esse exemplo é formidável! Algo tão inovador, mas ao mesmo tempo, tão simples, sem necessidade de tecnologias recentes, nem investimentos financeiros altíssimos. A empatia fez toda diferença. No entanto, podemos concordar que entender o ser humano não é tarefa simples, não é verdade? Nesse contexto, usam-se conhecimentos de diversas outras áreas (por exemplo a Antropologia e Psicologia) como ferramentas que auxiliam o registro e a compreensão de emoções, motivações, reações, necessidades, limitações...enfim, tudo aquilo que pode exercer influência sobre o comportamento do indivíduo em determinado cenário. Esses saberes compõem um escopo bastante amplo e não serão explorados a fundo neste artigo. 

A experiência do CCMS

Vocês sabiam que existem ferramentas que estimulam o desenvolvimento de certas habilidades que são fundamentais para o processo de criação centrado no ser humano? Por exemplo, nas oficinas de Design Thinking promovidas no Centro Cultural do Ministério da Saúde propomos o uso de algumas ferramentas que levam aos participantes a oportunidade de imergir na compreensão dos comportamentos. Uma dessas ferramentas é a entrevista. 

É necessário que os participantes se prepararem para a imersão, para que essa ferramenta seja bem aproveitada. Na preparação, eles definem o objetivo da entrevista, qual perfil que irão entrevistar e elaboram um roteiro relacionado ao contexto do desafio, isso tudo para que consiga esclarecer questões ainda em aberto, trazer novas perspectivas, ou seja, enriquecer ainda mais o processo de solução do desafio inicial. Após tudo pronto, solicitamos que saiam a campo e façam as entrevistas. Nesse processo, os entrevistadores avaliam o comportamento do entrevistado (observação), sua fala (escuta ativa), suas emoções (empatia), entre outros fatores. Vejam quantas habilidades são estimuladas num “simples” processo de entrevista! 

Após a vivência como entrevistador, os participantes conhecem a ferramenta Mapa de Empatia, um modelo simples, impresso e organizado de forma a facilitar o agrupamento das percepções extraídas na entrevista (vide imagem abaixo). Todas as percepções e reflexões que envolvem a experiência são colocadas na mesa, compartilhadas e debatidas, florescendo, assim, um pouco de sensibilidade e empatia com o usuário. O resultado dessa imersão serve como base para novas fontes de inspiração e para o desenvolvimento de ideias de forma mais direcionada, pensando nos fatores que entregarão maior valor para as dores e necessidades do usuário, seja para novos produtos, novas versões de produtos já existentes, serviços e etc. 

Acharam interessante? Dá até vontade de praticar, né? Vão com tudo! Esperamos com esse artigo tê-los ajudado a compreender um pouco mais sobre empatia e o processo criativo centrado usuário. Até a próxima! 
 

Exemplo de quando a técnica do "design centrado no ser humano" não é utilizada. Na imagem é possível ver o desgaste no gramado causado pela passagem das pessoas, que não respeitam o caminho projetado por ele não ser o mais confortável

O traçado na cor azul representa a pista construída para os pedestres, já o laranja representa o percurso desejável, que os pedestres fazem naturalmente

REFERÊNCIAS 

Brown, T. Design thinking: uma metodologia poderosa para decretar o fim das velhas ideias. Rio de Janeiro: Alta Books, 2017. 

Kelley, T. Confiança Criativa: liberte sua criatividade e implemente suas ideias. Rio de Janeiro: Alta Books, 2019 

Foto de destaque: Pexels (Creative commons)